Crítica – Aquaman 2: O Reino Perdido afunda o DCEU com aventura fraca e caótica

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Crítica – Aquaman 2: O Reino Perdido afunda o DCEU com aventura fraca e caótica

Por Jaqueline Sousa

Existe (ou existia) uma certa ousadia no DCEU em simplesmente deixar que seus filmes caminhem com suas próprias pernas. Não que eles estivessem imunes de preencher os pré-requisitos básicos do formato em um mundo pós MCU, mas a existência desconexa, bagunçada e caótica de suas produções sempre resultou em obras bastante diferentes entre si, cada uma com sua própria identidade independente de terem um boa execução ou não.

É exatamente dessa maneira que Aquaman 2: O Reino Perdido fecha as portas do antigo universo cinematográfico da DC, abrindo uma nova janela para a próxima fase do estúdio nas telonas. Com o retorno de James Wan (Maligno, Invocação do Mal) na direção, a sequência do lucrativo filme de 2018 chega aos cinemas sem grandes alardes, e é até quase um alívio ver os créditos subindo na tela. Isso porque, mesmo com o apoio do brilhantismo de Wan, o longa que encerra o DCEU parece um carro desgovernado e completamente sem rumo, apesar de, pelo menos, tentar trilhar seu próprio caminho.

Ficha técnica

Título: Aquaman 2: O Reino Perdido

 

Direção: James Wan

 

Roteiro: David Leslie e Johnson-McGoldrick

 

Data de lançamento: 20 de dezembro de 2023

 

País de origem: Estados Unidos da América

 

Duração: 2h 4min

 

Sinopse: Mais temível do que nunca e movido pela necessidade de vingar a morte de seu pai, Arraia Negra detém agora o poder do mítico Tridente Negro e sua ancestral força malévola. Para derrotá-lo, Aquaman recorrerá a seu irmão Orm, o ex-Rei da Atlântida, ainda na prisão, para forjar uma aliança improvável. Juntos, eles vão ter que deixar de lado suas diferenças para proteger seu reino, salvar a família de Aquaman e o mundo da irreversível destruição.

Pôster de Aquaman 2: O Reino Perdido.

A maré está virando

Entre lutar contra o próprio irmão, enfrentar a fúria dos mares e assumir o trono de Atlântida mesmo sem ter experiência no assunto, Arthur Curry (Jason Momoa) não esperava que se tornar pai seria a tarefa mais desafiadora de sua vida. Ao lado de Mera (Amber Heard) e da família, o herói aquático tenta equilibrar as obrigações domésticas com seus deveres embaixo d’água até que uma antiga ameaça ressurge em busca de vingança, libertando um perigoso poder há muito esquecido.

Aquaman 2: O Reino Perdido chega em um período bastante delicado da indústria cinematográfica no que diz respeito aos filmes de super-heróis. Além de passar o bastão para a aguardada próxima fase do DC Studios, agora comandada por James Gunn e Peter Safran, o longa se insere em uma conversa já muito desgastada sobre a tal fadiga do gênero, que enfrenta uma crise de mediocridade intensa há uns bons anos. E mais: a sequência de Aquaman chega em um cenário onde ele já nasce lutando contra o esquecimento, tanto do público quanto do próprio estúdio que o colocou no mundo.

Aquaman 2 encerra DCEU sem grandes alardes.

Afinal, por que se contentar com o velho DCEU, se o que James Gunn e companhia prometem parece ser muito mais interessante do que um universo que vem falhando, filme após filme, para conquistar relevância no formato? O fracasso de Shazam! Fúria dos Deuses e The Flash foi apenas o “começo do fim”, e Aquaman 2 praticamente afunda, sem parcimônias, a antiga fase do estúdio, transformando-a em uma equivalente de Atlântida. Funciona basicamente como a última pá de terra em cima do que ainda resistia da antiga DC nos cinemas.

Assim, honrando o caos e a bagunça que algumas produções do estúdio, como o Aquaman de 2018 e até o infame Esquadrão Suicida de 2016, sabem fazer de melhor, Aquaman 2: O Reino Perdido abraça sua própria desconexão para explorar uma nova história do herói, assumindo desde o início uma bobagem tão inocente que, apesar da sensação incômoda de que algo está fora do lugar, o clima de encerramento de festa acaba prevalecendo no final.

Tudo isso graças ao trabalho de James Wan, que consegue unir seus exageros únicos e ângulos interessantes para salvar aquilo que poderia ter sido um desastre ainda maior se estivesse em mãos menos competentes. É através de sua inventividade para explorar cenários vibrantes – mesmo que eles nunca cheguem perto da excelência técnica de um Avatar: O Caminho da Água (2022) ou até do primeiro Aquaman – e personagens caricatos (como um polvo que toca instrumentos) que o cineasta usa todo e qualquer aspecto tido como “bobo” a seu favor, dando permissão para que o filme não se leve muito a sério.

Apesar de não se levar a sério, sequência não consegue recuperar brilho do primeiro filme.

Além disso, desta vez, Wan ainda ganha um pouco mais de espaço para usar sua experiência no terror, explorando alguns aspectos mais sombrios em ameaças zumbificadas (que até lembram elementos visuais de O Senhor dos Anéis, em certa medida), por exemplo. São nesses detalhes e enquadramentos diferenciados que Aquaman 2 encontra seu fôlego, mesmo acelerando o processo de naufrágio do estúdio à medida que as horas passam.

O naufrágio iminente

Há outro aspecto de O Reino Perdido que funciona, juntamente com o apoio de James Wan: a relação entre Arthur e Orm (Patrick Wilson). Após os dramáticos eventos de Aquaman, onde os dois irmãos tomaram rumos diferentes depois de um confronto decisivo, a dupla precisa se unir para conseguir derrotar a ameaça de Arraia Negra (Yahya Abdul-Mateen II), que cumpre a posição preguiçosa do vilão em busca de vingança.

Assim como faz no primeiro Aquaman, Patrick Wilson aproveita mais uma parceria com Wan para explorar as nuances do personagem, mesmo que ele acabe se tornando vítima de uma trama picotada que, ao mesmo tempo que quer dizer muitas coisas, não sabe exatamente como fazer isso sem sair da superficialidade. Por outro lado, a dinâmica entre Wilson e Momoa capta a sua atenção mesmo quando o enredo falha em construir uma narrativa coerente e minimamente interessante.

Dinâmica entre Jason Momoa e Patrick Wilson é uma das poucas coisas interessantes de Aquaman 2.

Embora nem tudo esteja perdido em Aquaman 2, é difícil encontrar uma pérola no meio da vastidão de um oceano. Se existe uma dedicação nítida (e até bem-sucedida) em tentar explorar um pouco mais a relação entre Arthur e Orm, há outros aspectos do filme que caminham de mãos dadas com a mediocridade, como as tentativas rasas de fazer alertas sobre problemas ambientais (que não servem nem mesmo como notas de rodapé), sequências mais enérgicas confusas e antagonistas que, apesar de apresentarem potencial, não recebem o mínimo de desenvolvimento para gerar um senso de urgência.

Outro ponto amargo de Aquaman 2 é a maneira como Mera, personagem interpretada pela atriz Amber Heard, é tratada no filme. Enquanto no antecessor a heroína tem uma atuação marcante e decisiva na narrativa, na sequência ela funciona basicamente como um deus ex machina, existindo na trama apenas para oferecer soluções rápidas para ameaças iminentes.

É extremamente incômodo ver como a importância da personagem é reduzida. Mera orbita a vida de Arthur Curry apenas para estabelecer que, agora, ela é esposa e mãe do filho do herói, e que ocasionalmente usa seus poderes para proteger Atlântida. A atriz faz o que pode com esse descaso impulsionado por fatores externos, mas não deixa de ser triste e até injusto ver como uma personagem, que poderia ter crescido tanto na narrativa, é tratada como uma função meramente ilustrativa no longa.

Antagonistas são tão rasos que não provocam senso de urgência em Aquaman 2.

Nem mesmo a dinâmica de Arthur com Mera, elemento explorado no primeiro filme, consegue chamar sua atenção – até porque ela é praticamente inexistente. A tentativa de replicar a vivacidade contagiante do Aquaman de 2018, seja nos aspectos visuais ou na relação entre seus personagens, encontra pouco êxito na sequência, que parece estar mais ansiosa para encerrar de uma vez por todas esse capítulo tão conturbado da jornada da DC do que para construir uma obra que consiga sair da mesmice. Nem o próprio Jason Momoa se esforça o bastante para que o filme não aparente um desgaste preocupante do começo ao fim.

Assim, embora conte com a expertise de James Wan e abrace as bobeiras do formato sem vergonha alguma, Aquaman 2: O Reino Perdido é um – e perdão por mais uma comparação clichê com o universo marítimo – navio que, durante pouco mais de duas horas, naufraga no meio do oceano, sem deixar sobreviventes para contar essa triste história. Resta saber agora se a próxima fase do estúdio vai continuar honrando seu diferencial de criar identidades próprias, ou se vai apenas aceitar as regras medíocres do formato na tentativa de replicar o que um dia foi relevante.

Nota: 2,5 de 5.

Aquaman 2: O Reino Perdido está em cartaz nos cinemas brasileiros.

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