Como o cinema reforçou estereótipos negativos sobre saúde mental

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Como o cinema reforçou estereótipos negativos sobre saúde mental

Por Junno Sena

Psicose, Joker, Doutor Estranho no Multiverso da Loucura. Saúde mental é um tema recorrente nos cinemas. De estereótipos nocivos em relação a transtornos mentais até abordagens criativas sobre o assunto, aprendemos que até os personagens mais poderosos da cultura pop já enfrentaram situações difíceis. Porém, o que o cinema está ensinando sobre saúde mental?

Um espírito livre, um maníaco homicida, sedutores e ninfomaníacos, um membro “iluminado” da sociedade, um parasita narcisista, um espécime de zoológico. Esses são apenas alguns dos principais estereótipos de transtornos mentais apresentados ao longo dos anos nos filmes. Quando o tópico é saúde mental, a mente humana é levada ao seu extremo e temos os piores aspectos mostrados em tela.

Violência, agressão e comportamentos bizarros se tornam o principal foco de casos bem menos físicos, como ansiedade. Já a depressão, em alguns indivíduos se torna pura “histeria feminina”, retornando a um dos piores momentos do estudo da psicanálise. Alguns estudiosos apontam esse fascínio pelo pior como a saída para que roteiristas e produtores encontrem “conflitos polarizados” ao invés de “tomarem uma abordagem geral no assunto”.

Uma das principais críticas a Coringa é não tratar adequadamente de temas como saúde mental.

Em outras palavras, o drama vende e assistir uma mulher destruindo o multiverso pelos seus filhos é uma saída mais interessante narrativamente do que colocá-la para enfrentar as dores de sua depressão. Assim como assistir um homem culpabilizar a sociedade pelos seus problemas e iniciar uma revolução é mais cativante do que vê-lo aprendendo sobre as próprias dores.

Mas, no final, é essa a única abordagem possível para criar empatia entre paciente e espectador? Em um estudo de 2005, o pesquisador Jeremy Butler e Steven Hyler entrevistaram uma garota de 17 anos que revelou que se sentiu amparada e empoderada após assistir Angelina Jolie em Garota, Interrompida.

O motivo para isso foi como ela passou a se sentir confortável com a própria bipolaridade e transtorno de personalidade antissocial. Em Garota, Interrompida, temos diversos dos estereótipos negativos listados anteriormente, mas em uma menor escala, focando no desenvolvimento do personagem e menos em seus “comportamentos questionáveis”.

Angelina Jolie vive Lisa Rowe em Garota, Interrompida.

E talvez esse seja o grande problema de como o cinema representa saúde mental. Na maioria das vezes, não é sobre o indivíduo ou sua jornada de autodescoberta, mas como sua “doença” afeta a todos ao seu redor. Ou, melhor, como esse personagem doente “destrói” o mundo o qual pertence.

Algo de que diretores como Alfred Hitchcock são adeptos. Em Psicose, por exemplo, utilizam de transtornos psiquiátricos para justificar os atos cometidos por Norman Bates. Não apenas isso, mas há um interesse em culpabilizar a possível sexualidade do homem ou, pelo menos, seu interesse em vestes femininas.

Não muito diferente disso é a história de O Silêncio dos Inocentes, livro de Thomas Harris adaptado para os cinemas em 1991. Nele, o grande assassino em série e antagonista — além de Hannibal — é Buffalo Bill, uma figura andrógina que sofre com diversos distúrbios mentais, mas é lembrada pelo público como “uma travesti violenta”, mesmo não se tratando de uma travesti.

Buffalo Bill, de O Silêncio dos Inocentes, é um dos principais exemplos de como o cinema errou ao tratar de saúde mental.

Todas essas imagens criam um preconceito no entendimento geral do público sobre saúde mental. Como dizem Butler e Hyler em Hollywood Portrayals of Child and Adolescent Mental Health Treatment (A Representação de Hollywood sobre o Tratamento da Saúde Mental de Crianças e Adolescentes em tradução literal), “o público tem muito menos contato com psiquiatras de verdade do que com representações midiáticas”. A psiquiatria, psicologia, transtornos mentais e saúde mental são apenas uma grande “caixa de Pandora” para o público. Quando aberta, pode trazer todo tipo de horror. E alguns deles apenas vivem na imaginação de quem está em posse da caixa.

Mas, mesmo entre aspectos positivos e negativos, representatividade boa ou ruim, essas produções são a ponte entre o leigo e o que há de desconhecido. Entre quem não faz ideia pelo o que está havendo com ela e o nome dado ao que ela está passando.

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