Review: A Casa do Dragão 1×08 O Senhor das Marés e 1×09 O Conselho Verde

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Review: A Casa do Dragão 1×08 O Senhor das Marés e 1×09 O Conselho Verde

Por Melissa de Viveiros

A Casa do Dragão está quase no fim de sua primeira temporada, tendo finalmente chegado ao fatídico episódio 9 – marcado em Game of Thrones por suas reviravoltas e cenas marcantes. Aqui, porém, a vontade de replicar essa fórmula lembra as temporadas finais da antecessora, e mostra que o projeto da HBO está mais interessado em momentos impactantes do que coerência narrativa.

Rhaenys, a Rainha Que Nunca Foi, infelizmente se tornou vítima do momento feito para impressionar que não tem consequências reais. (Reprodução: HBO)

Mas, além de comentar sobre o nono episódio, vou escrever um pouco sobre o oitavo, que não tive a chance de discutir antes.

A minha opinião dos dois capítulos mais recentes de A Casa do Dragão é bem contrastante, uma flutuação que quem estiver acompanhando as reviews já deve ter percebido que não é algo novo. A jornada ainda não acabou, mas já ficou marcada por problemas gritantes quando o assunto é a narrativa, ao mesmo tempo em que apresentou personagens interessantes e desenvolvimentos incríveis.

Se o nono episódio se destaca pelas falhas, o oitavo foi o oposto. A despedida de Viserys da série é grandiosa, mas acima de tudo, é emocional. Paddy Considine dá ao personagem todo o peso dramático que ele merece, tanto em seus momentos mais poderosos quanto nos mais vulneráveis. A caminhada final do rei até o Trono de Ferro certamente é uma das cenas mais dramáticas da série, do tipo que ficará marcada pelo público e com razão, com uma atuação incrível que marca o ápice da narrativa do monarca em decadência, enquanto demonstra de modo tocante o carinho dele por Rhaenyra (Emma D’Arcy) e Daemon (Matt Smith).

Paddy Considine é quem rouba a cena no oitavo episódio, que marcou sua despedida da série. (Reprodução: HBO)

Toda a narrativa política, a tensão em volta da disputa de poder ao redor da herança de Driftmark, só contribuem para a série como um todo. Fica claro que Rhaenyra cometeu erros, dando espaço para os Verdes conquistarem mais poder além de ter dado munição para a questionarem por seus filhos não se parecerem em nada com o suposto pai. Já em uma posição frágil, a busca dela por felicidade entra em seu caminho pelo trono, e as consequências começam a aparecer mesmo antes da morte de seu pai.

Vaemond é um personagem secundário, apenas buscando se beneficiar e proteger sua família. Seu desprezo fica tão claro em alguns momentos, graças à atuação de Wil Johnson, que não dá para negar elogios ao trabalho do ator. Mais que mero desdém, ele mostra o quão profundamente afetado está pelo destino de sua Casa, não agindo só por ambição mas também por seu orgulho como Velaryon.

Sua morte, esperada pelos leitores dos livros, pode ter chocado a alguns espectadores. Ainda assim, aproveitando para fazer a fatídica comparação, devo dizer que o momento deixa a desejar. Enquanto em Fogo & Sangue esse é um dos primeiros momentos de tirania de Rhaenyra, que executa Vaemond por decisão própria e dá seu cadáver de comida para seu dragão, aqui é Daemon quem age. Esse é um problema que se agrava no próximo episódio: nenhuma mulher da história pode fazer algo controverso por conta própria, tudo é sempre culpa dos homens ao redor delas, que controlam tudo que acontece.

Nem Rhaenyra nem Alicent tem tanta agência sobre a situação quanto deveriam. (Reprodução: HBO)

Isso é algo muito decepcionante, principalmente considerando como a Dança dos Dragões ficou marcada pelo conflito entre a princesa e a rainha. Mas se Rhaenyra sofre com o peso de ser herdeira da coroa, mesmo Alicent não tem permissão de ser ambiciosa ou ousada, sempre se dobrando aos homens ao seu redor, sendo vítima de obsessões nojentas apesar de ser rainha ou querendo de bom grado desistir da disputa pelo trono até que Viserys diz em seu leito de morte algo que a faz mudar de ideia. 

Nem nisso a motivação é dela. Ela não se importa mais com o risco que sua família irá correr, aparentemente – só com o último desejo de Viserys, o marido pelo qual ela chora mesmo após tudo que sofreu no casamento. É um reducionismo enorme em relação à personagem apresentada nos livros, disfarçado como nuance quando, na verdade, não acrescenta nada, simplesmente tirando a agência da personagem e a deixando à mercê do que os homens ao seu redor desejam dela.

Mas, saindo das comparações com os livros e retornando ao oitavo episódio, a cena do banquete funciona como um derradeiro momento de paz antes da guerra. O gostinho do que poderia ter sido adiciona algo de trágico à trama, assim como a quebra da aparente trégua pelas gerações mais novas, mostrando como as sementes desse conflito já cresceram e dão frutos, e que não basta Alicent e Rhaenyra quererem fazer as pazes.

Aemond (Ewan Mitchell) mostrou que não está a fim de fazer as pazes. (Reprodução: HBO)

 

É uma boa escolha narrativa, deixada ainda melhor pela noção de que os últimos momentos de Viserys em meio a eles foram passados acreditando que ainda haveria paz. Mesmo em relação às duas personagens de maior destaque, é interessante ver que ambas, cansadas, se apegam à amizade que um dia tiveram.

No geral, é um episódio bom para seus personagens, não só em relação a desenvolvimentos, mas para mostrar melhor quem eles são, explorar seus sentimentos e motivações, dar um entendimento de suas dinâmicas e como isso impactará o futuro. Nem todo mundo sai ganhando (Helaena, Baela e Rhaena, ainda que carismáticas nos poucos momentos que tem, nem de longe tem relevância similar a Aegon, Aemond, Jacaerys e Lucerys). Mesmo assim, há o que se elogiar em como o episódio conduz sua trama.

Pena que o mesmo não pode ser dito do nono capítulo da série. O Conselho Verde poderia ser muito mais que é, principalmente se apoiando na trama ao redor da tomada de poder de Alicent e seus partidários. Ao invés disso, a narrativa traz adições desnecessárias e momentos simplesmente ruins.

Lembram quando Alicent começou a colocar na cabeça do filho que ele seria rei? Pois é, agora aparentemente ela se surpreendeu que alguém estava fazendo planos para fazer isso acontecer. (Reprodução: HBO)

Além dos já citados problemas em relação a Alicent, me parece muito burro que uma personagem que até então vinha determinada a tomar o trono pelo risco que Rhaenyra apresenta a sua família simplesmente ignore isso agora. É ainda pior que seus supostos apoiadores viessem planejando tudo sem ela, e que ela se surpreenda com isso (não era sua intenção há anos tornar Aegon rei, como ela mesma apontou para o filho?).

Criston Cole adiciona mais uma morte desnecessária à sua conta (embora pelo menos dessa vez faça sentido que aqueles ao seu redor não clamem por justiça). Mysaria é colocada em uma subtrama que parece existir apenas para justificar que ela busque vingança depois. E, claro, Rhaenys (Eve Best) protagoniza a grande cena do episódio feita apenas “para causar”.

Porque, sinceramente, é tudo que o momento é. A chegada explosiva dela ao septo, matando centenas de inocentes (que, de acordo com a própria roteirista, não importam porque são apenas civis), seria perdoável se isso fosse abordado na trama. É claro, porém, que esse não é o caso. O importante é só o impacto do momento, a grandiosidade – coerência na história e consequências de ações não importam.

Rhaenys aparece em seu dragão, mata civis, mas não consegue matar os Verdes porque entende Alicent, já que ambas são mães. Quer mais estereótipo ultrapassado e falta de lógica narrativa que isso? (Reprodução: HBO)

Colocá-la cara a cara com os Verdes e não deixar que ela faça nada contra eles, após matar inocentes, justificando isso com a simpatia entre ela e Alicent por ambas serem mães em material extra do episódio é um desserviço a duas personagens que poderiam ser muito mais. A história não podia acabar ali, claro, mas a solução é simples: não colocassem Rhaenys ali, ou mesmo apresentassem uma ameaça da qual ela precisasse escapar. A narrativa escolhida levou até ali; não há justificativa de “não tinha outra maneira”.

É bem triste que em sua primeira temporada a série já caia nesses problemas. Próximo do fim da temporada, não dá para acreditar que melhore muito, aqui ou nas temporadas por vir. Enquanto a obra de George R. R. Martin destaca o impacto da guerra dos nobres sobre aqueles que nada tem a ver com ela, na adaptação o povo comum é descartável, peças para o choque do público e nada mais. Porque, no fim, isso é tudo que importa: o burburinho nas redes sociais, o choque por si só, o momento “girlboss”, e nada precisa ter significado ou consequência, desde que seja espetáculo o bastante.

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