[Crítica] Cursed: A Lenda do Lago traz uma visão interessante da lenda do Rei Arthur

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[Crítica] Cursed: A Lenda do Lago traz uma visão interessante da lenda do Rei Arthur

Por Gus Fiaux

As Lendas Arturianas já fazem parte da cultura pop mundial, seja através das adaptações mais fieis aos mitos clássicos até às diversas releituras que expandem o universo do Rei Arthur e sua Távola Redonda. Agora, a Netflix está se lançando de cabeça em uma nova produção original que traz uma nova perspectiva para essas histórias. Estamos falando de Cursed: A Lenda do Lago.

A série é baseada no livro de Frank Miller Tom Wheeler, e faz uma subversão das lendas clássicas a partir do ponto de vista de Nimue, a Dama do Lago – uma figura extremamente importante na mitologia e que tem uma ligação direta com o Rei Arthur e com a lendária espada Excalibur.

Nós já recebemos os cinco primeiros episódios da série, e pudemos analisar um pouco dessa história repaginada. Será que a Netflix tem um novo sucesso em mãos, nas veias de The Witcher, ou será que a série não consegue submergir do lago? Aqui você pode ler a nossa crítica!

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Cursed: A Lenda do Lago é um interessante experimento com a lenda do Rei Arthur

Da literatura ao cinema, passando pelos quadrinhos, jogos e séries de TV, as lendas do Rei Arthur e da Távola Redonda são domínios muito conhecidos pelo público. Misturando elementos de histórias reais com mitologia celta, esse conjunto de mitos e lendas perpassou a cultura pop em várias formas e versões, com muitas histórias que reformulam e recriam esses personagens heroicos em uma nova versão.

Portanto, não é incomum que cada figura presente nesses mitos já tenha sido o centro de suas próprias histórias. Arthur, Merlin, Morgana, Guinevere, LancelotPercival… todos já tiveram suas vozes ouvidas. E graças a Cursed: A Lenda do Lago, agora é a hora de muitos descobrirem a perspectiva de Nimue, uma criatura fantástica que talvez seja mais conhecida como a Dama do Lago.

A série, inspirada em um livro ilustrado escrito por Frank Miller Tom Wheeler, conta um pouco da história que já conhecemos, subvertendo diversos elementos e criando novos significados com os mitos arturianos. O resultado é um experimento bem interessante, mas que ainda precisa encontrar mais maturidade em seus personagens e seu desenvolvimento para realmente se destacar.

A série, no entanto, não começa com a Dama do Lago que muitos estão acostumados. De início, vemos Nimue, uma adolescente com dons mágicos que é vista com maus olhos dentro de sua própria comunidade, o Povo do Céu. Porém, preconceitos bobos logo dão lugar a uma caçada sanguinária e opressiva por parte dos Paladinos Vermelhos, uma organização clerical que quer livrar o mundo de qualquer traço de magia em nome de Deus.

Assim começa a aventura da garota, que precisa viajar por terras longínquas para entregar uma espada mais que especial para Merlin. E é óbvio que, nesse caminho, ela vai se deparar com todo o tipo de figuras míticas conhecidas – algumas inclusive bem inusitadas. No processo, Nimue se torna o rosto de uma verdadeira revolução para todos os povos feéricos da Grã-Bretanha.

Desde o início, é importante situar o espectador: não vá para Cursed esperando The Witcher. Por mais que a série estrelada por Henry Cavill tenha ditado o teor da fantasia na Netflix, a aventura de Nimue é muito mais voltada para um público jovem-adulto, que já está acostumado com esse tipo de narrativa graças a Harry Potter, Jogos Vorazes e outras incontáveis sagas literárias.

O destaque aqui, como não podia deixar de ser, vai para Katherine Langford (13 Reasons Why), que interpreta Nimue. A atriz realmente tem talento – mesmo que tenha se envolvido em produtos de qualidade questionável na própria plataforma de streaming -, e sua personagem na série é uma protagonista admirável, resiliente e até mesmo carismática, tal qual uma Katniss Everdeen reformulada e dotada de poderes místicos.

Além dela, ainda temos Gustaf Skarsgård como Merlin, Shalom Brune-Franklin como a misteriosa Igraine, Daniel Sharman como um enigmático antagonista que atende apenas pela alcunha de “O Monge Chorão” e, é claro, Devon Terrell como Arthur, muito antes de se tornar o respeitado rei das lendas e mitos. E nesse elenco coadjuvante estão justamente os pontos altos e baixos da série.

Gustaf traz muitos elementos interessantes para o Mago Merlin, enquanto Shalom e Daniel usam do mistério como seus principais aliados, dando profundidade aos seus personagens e criando figuras com muita importância dentro do arco de Nimue. Por outro lado, Devon realmente parece desconfortável no papel do Rei Arthur. Ele tem bons momentos e até sabe conduzir algumas cenas, mas não consegue passar a firmeza esperada do personagem.

O fator contraditório, no entanto, está em como esses personagens são retratados pelo roteiro. Como se trata de uma “adaptação para o público jovem-adulto”, vários personagens acabam caindo em arquétipos e estereótipos um tanto clichês. Merlin é o típico mentor louco das ideias e completamente excêntrico, mas com um espírito jovial e rebelde – algo que já vimos em absolutamente todas as sagas infanto-juvenis, de alguma forma (Haymitch de Jogos VorazesSirius de Harry PotterLee Scoresby de His Dark Materials.

O mesmo vale para a própria Nimue. A personagem acaba se encaixando tanto no papel da “protagonista escolhida/amaldiçoada que precisa se tornar a face de uma revolução”, que isso não dá o espaço necessário para que ela cresça de fato, por mais que Katherine Langford dê o seu melhor. Ao menos, a série consegue colocá-la em diversas situações que atestam seu caráter e suas escolhas, o que diversifica um pouco de sua “jornada do herói“.

Quanto aos quesitos técnicos, a série surpreende positivamente. Cursed possui uma estética interessante e efeitos visuais bem competentes, ainda que um ou outro defeito não passe despercebido. A trilha sonora é um ponto altíssimo, que confere um bom senso de maravilha e de emoção à história. Por outro lado, a fotografia acaba variando muito de episódio para episódio – com alguns sendo muito bonitos e outros com severos erros de continuidade e de edição.

Reclamar da duração dos episódios (uma hora para cada), nesse momento, é chover no molhado da Netflix. É muito intrigante que uma plataforma de streaming que ofereça tanta liberdade para seus criadores continue insistindo em um molde que é, no mínimo, exaustivo. E no que diz respeito a Cursed: A Lenda do Lago, várias subtramas focadas em personagens coadjuvantes poderiam facilmente ser cortadas.

No final das contas, a série é uma boa ideia com uma execução que ainda deixa um pouco a desejar, mas que pode acabar crescendo (tanto nos cinco episódios que restam para finalizar a primeira temporada quanto em um eventual segundo ano). E para que essas melhorias se concretizem, é essencial que a série perca um pouco do tom “jovem-adulto” e parta para algo diferente – mesmo que se distancie ainda mais dos mitos clássicos.

Em suma, Cursed: A Lenda do Lago é um experimento interessante. Não é tão polida quanto poderia ser – especialmente em seu roteiro e em algumas atuações -, mas consegue criar uma nova perspectiva para a mesma história que já foi contada diversas vezes. Quem sabe, a série tenha um grande potencial dentro da Netflix – e após o cancelamento de produções juvenis como O Mundo Sombrio de Sabrina October Faction, a série ainda pode ter um futuro muito peculiar.

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Cursed: A Lenda do Lago está disponível na Netflix.