[CRÍTICA] Maus Momentos no Hotel Royale – Desventuras em alto estilo!
[CRÍTICA] Maus Momentos no Hotel Royale – Desventuras em alto estilo!
Longa finalmente chegou ao Brasil!
Às vezes, o mercado cinematográfico age de forma infiel com o público internacional. Alguns filmes aguardados são deixados de lado, estreando meses após seu lançamento original nos Estados Unidos. Esse é o caso de Maus Momentos no Hotel Royale.
O filme foi lançado em outubro do ano passado nos EUA, mas chega ao Brasil apenas no dia 17 de janeiro. Nós já tivemos a oportunidade de conferir o mais novo longa de Drew Goddard, e aqui está nossa opinião sobre esse festival insano!
Créditos: 20th Century Fox

Ficha Técnica
Título: Maus Momentos no Hotel Royale (Bad Times at the El Royale)
Ano: 2018
Data de lançamento: 17 de janeiro de 2019 (Brasil)
Direção: Drew Goddard
Duração: 141 minutos
Sinopse: Em 1969, vários estranhos – alguns com segredos para enterrar – se encontram no El Royale, um hotel na beira da estrada com um passado sombrio. Durante uma única noite, todos vão mostrar suas verdadeiras faces – antes que tudo se torne um inferno.

Maus Momentos no Hotel Royale – Desventuras em alto estilo!
Se há uma convenção da qual muitos cineastas se apropriaram ao longo dos anos foi justamente a ideia de tornar o cinema seu próprio objeto de estudo, principalmente através de metáforas. Alfred Hitchcock já havia feito isso com seu brilhante Janela Indiscreta, de 1954. Mais de meio século depois, Drew Goddard recria um feito parecido com seu Maus Momentos no Hotel Royale.
Charmoso, inspirado e com um estilo inigualável, o filme tem um caráter voyeurístico que mescla aspectos de Hitchcock com Tarantino. Aqui, um padre, uma cantora, um vendedor e uma mulher rebelde se juntam para uma estadia em um hotel à beira da estrada. No entanto, as histórias começam a convergir, alianças são formadas e, ao fim da noite, ninguém está a salvo.

Maus Momentos no Hotel Royale é um filme típico da filmografia de Goddard. Por mais que o cineasta já tenha se envolvido com algumas séries televisivas, como Demolidor, sua obra máxima até o momento continua sendo O Segredo da Cabana, filme que subverte os clichês do horror e o transforma em uma linguagem absolutamente nova e inspiradora, enquanto traz mais elementos para a mesa.
De certa forma, Maus Momentos faz o mesmo a abordar facetas do cinema noir. É um filme que dialoga com vários dos arquétipos – o homem com um passado torturado, a femme fatale, o insano antagonista – e, ao mesmo tempo, insiste em uma roupagem inovadora, com ares de um cinema cuja estética às vezes se sobressai à história, ainda que haja um constante equilíbrio sentido.

O filme basicamente segue várias linhas narrativas, ao explorar, pouco a pouco, a história de cada um desses hóspedes. O padre Daniel Flynn, vivido por Jeff Bridges, se apresenta como um personagem extremamente interessante, com uma faceta bem distinta do que se espera dele. O mesmo pode ser dito por Laramie Sullivan, o vendedor racista e inconveniente vivido por Jon Hamm.
Por outro lado, é o elenco feminino que realmente mostra suas garras. Dakota Johnson aparece pouco, mas faz uma interpretação muito sólida no papel de Emily Summerspring. Já Cynthia Erivo rouba cada cena em que aparece, como a sonhadora Darlene Sweet. A atriz dá uma performance sensacional, também usando seu belo vozeirão para deixar o público à flor da pele com algumas sequências musicais.

Mas é óbvio que isso é apenas a ponta do iceberg. Ainda temos Chris Hemsworth em uma das performances mais surtadas de sua carreira, uma vez que ele interpreta um “líder de culto”, esbanjando sensualidade e uma presença (literalmente) assassina. Outro que rouba a cena é Lewis Pullman, no papel do atendente do hotel, Miles Miller - papel que anteriormente pertenceria a Tom Holland.
Juntos, esses personagens formam a grande alma que faz o filme ser tão interessante e tão ágil. Apesar dos vários personagens, cada um deles acrescenta algo de essencial à trama, e o filme sabe exatamente a hora de deixá-los. Em momento algum sentimos que alguém aparece mais do que deveria, apenas por conta de seu potencial de astro. Isso pode ser dito sobre Nick Offerman, de Parks and Recreation, que faz apenas uma ponta.

No entanto, engana-se quem pensa que o único charme de Maus Momentos no Hotel Royale está no elenco surpreendente. Tudo aqui conspira para funcionar de uma forma intrincada e segura. Algumas revelações são feitas ao longo do filme, justificando elementos que nos deixaram confusos no início, e criando uma complexa teia de set-ups e payoffs (promessas e entregas) que realmente causam um senso de recompensa ao final.
Outro ponto indispensável está na brilhante direção de arte e fotografia, que conseguem dar foco a objetos pequenos no set, mas que possuem importância significativa. Isso, aliado a um figurino poderoso, ajudam a criar uma personalidade forte, digna dos melhores filmes neonoir. No fim das contas, o longa até tem um pezinho em inspirações alheias, mas consegue ser muito original e único.

Falando nessas inspirações, não há como negar as comparações com Os Oito Odiados, último filme lançado por Quentin Tarantino. Embora a história seja razoavelmente diferente, a quantidade de personagens e a existência de uma ligação inusitada entre eles torna a comparação válida. No entanto, se o filme de Tarantino sofre com alguns problemas de ritmo e revelações de última hora, Maus Momentos se livra dessa sina.
O filme possui uma narrativa bem mais direta e ágil, tornando a história um deleite para quem estiver disposto a mergulhar nela. A decisão de revelar cada trama aos poucos também causa um interessante Efeito Roshamon, onde somos expostos às verdades individuais de cada personagem antes de encontrarmos a história como ela realmente aconteceu – e isso traz uma série de complexidades narrativas bem intrigantes para a trama.

No fim das contas, Maus Momentos no Hotel Royale funciona quase como um livro escrito por Agatha Christie. Por mais que não tenhamos um detetive encaminhando toda a história, como um Hercule Poirot da vida, o surgimento de vários personagens e o encaminhamento de vários mistérios menores que conduzem a um enigma maior lembra bastante a narrativa de livros como O Assassinato do Expresso do Oriente.
Mais do que isso, o que realmente convence na história é a propensão de Goddard de nos colocar como voyeurs em uma trama maior – e se você ainda duvida disso, a cena em que o personagem de Jon Hamm olha através de vários espelhos, observando o que cada um dos hóspedes está fazendo em seu quarto, é justamente uma cena que condensa esse aspecto em uma única dimensão narrativa.

Dentro do que se propõe, o filme atinge aspectos altos de perfeição. Há um deslize ou outro no que diz respeito às revelações. Há quem possa achar as reviravoltas um pouco bruscas demais – mas particularmente, não considero isso um defeito do longa, e sim uma questão pessoal de cada espectador. No geral, todas as revelações possuem a mesma fórmula de promessa e entrega, sem fazer o público de idiota com surpresas óbvias ou revelações sem sentido.
E se a narrativa está em um alto patamar de qualidade, todos os aspectos técnicos seguem em um nível igualmente impressionante. O trabalho sonoro é digno de prêmios, especialmente na sequência em que ouvimos Darlene Sweet cantar em seu quarto, enquanto a cena brinca com a dimensão do ouvinte, pondo o foco em Laramie Sullivan, que anda por um corredor extenso. O mesmo vale para as já mencionadas fotografia e direção de arte.

Em outras palavras, Maus Momentos no Hotel Royale é um filme deslumbrante – e diferente do que seu título sugere, certamente vai trazer ótimos momentos para quem está assistindo. É um exercício singular sobre o que nos traz prazer ao parar para assistir sobre a vida de personagens fictícios, além de trazer um grande requinte visual e estético, diferente de tudo que temos no mercado atualmente.
Com uma fotografia incrível, um elenco excepcional e um diretor cada vez mais seguro do que faz, Maus Momentos é uma aventura insana e delirante, que se expressa camada após camada, como uma boneca russa de emoções. É um exercício sobre a experiência cinematográfica – e acima de tudo, um filme que jamais falha em deixar seu público entretido e maravilhado.
NOTA: 5/5