[CRÍTICA] Castlevania: 1ª Temporada – Uma nada miserável pilha de entretenimento!

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[CRÍTICA] Castlevania: 1ª Temporada – Uma nada miserável pilha de entretenimento!

Por Lucas Rafael

Desenrolando-se em quatro episódios, neles somos apresentados à ira de Drácula, enquanto o jovem Trevor Belmont inicia uma jornada relutante através de um mundo gótico inundado por sangue inocente.

Imagens: Divulgação/Netflix
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Um Mundo Cinza

O que capta a atenção imediata no desenrolar da trama em Castlevania é o fato das coisas não se apresentarem de uma maneira clichê "preto no branco". Drácula não é o cara mau e Trevor, o salvador da pátria iluminado. Existem aqui camadas de cinza que fazem o espectador torcer pelo próprio Drácula nos minutos iniciais da série.

Castlevania conta com essa nuance da trama que critica de maneira ácida os perigos da superstição religiosa. Ali pela metade do primeiro episódio, nos vemos simpatizando com Drácula e colocando a igreja - e seu arcebispo - no papel dos antagonistas.

Drácula pode até ser do mal, mas a humanidade é doentia.

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Ambientação gótica

Outra coisa que a animação adapta de maneira incrível dos jogos é a ambientação gótica desse universo. Vilarejos, igrejas e castelos, todos ornamentados de maneira primorosa.

Existe algo bastante remetente às obras que originaram essas histórias vampirescas, com uma veia bastante folclórica e histórica colidindo simultaneamente. Desde a perseguição das bruxas à implicância da igreja com métodos científicos, até vampiros reclusos, monstros em túneis secretos e bestas infernais. O universo de Castlevania é cativante.

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Humor

O humor em Castlevania não desaponta, sejam as tiradas sarcásticas de Trevor Belmont ou os diálogos inusitados por parte de outros personagens. O que faz o humor da animação funcionar tão bem em seu contexto é que ele não entra em conflito com a atmosfera da série: é um humor negro e sarcástico, que não destoa do clima sombrio imposto pelos cenários decrépitos.

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Uma mitologia rica

Castlevania lida com uma mitologia estabelecida. Drácula já é um homem recluso, isolado em seu castelo e existe toda uma história de fundo tratando das famílias daquele universo e suas empreitadas passadas, como os Belmont, que tiveram sua reputação denegrida e foram quase extintos graças à igreja. Temos também os Oradores, uma ordem criada para a série. Esses pequenos fiapos da história passada de Wallachia nos ajudam a entender um pouco a situação atual de desesperança.

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Personagens

O primeiro episódio de Castlevania é focado em fazer de Drácula uma figura moralmente ambígua, para que o personagem não caia no clichê território de vilão cartunesco nefasto. Funciona. Esse papel de antagonismo vilanesco, no entanto, acaba recaindo sobre os membros da igreja e seu novo bispo - um coletivo preocupado excessivamente com o controle das massas ao invés de chegar numa solução definitiva para os problemas que as assolam. No mais, com a exceção de Trevor Belmont e Drácula, não temos uma profundidade muito grande sendo atribuída ao restante dos personagens, o que pode ter relação com a curta duração do anime.

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Uma série para todos

Talvez um dos maiores acertos de Castlevania seja apostar em uma história que funcione para todos: dá pra passar pelos quatro episódios e aproveitar o material mesmo sem ser um fã hardcore dos jogos da franquia. Existe algo aproveitável em nível de entretenimento para todos aqui, desde para quem quer uma boa animação sobre vampiros até pra quem busca uma adaptação digna da franquia de jogos.

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Vamos falar sobre adaptações

Adaptações de uma mídia para outra sempre contam com ruídos, sejam livros ou games. Castlevania não é diferente. A série adapta o terceiro jogo da franquia, Castlevania III: Dracula's Curse, uma prequel dos dois primeiros títulos da franquia, protagonizada por Trevor Belmont. Vale lembrar que Castlevania: Lament of Innocence conta uma história que se passa antes mesmo de Dracula's Curse, mas faz sentido a série começar adaptando por ali.

Existem algumas referências e easter eggs que podem ser facilmente identificadas pelos fãs da franquia, como uma personagem que tem uma apresentação igual a do jogo, encontrada petrificada. Dá pra se divertir caçando as referências.

As principais divergências, entretanto, existem em termos narrativos. Drácula era um personagem menos merecedor de nossa empatia nos jogos, sendo um inimigo tão claro quanto a igreja para Trevor encarar. Na animação, a moralidade dúbia de certos personagens acrescenta uma nova dinâmica para o desenrolar das coisas. Drácula está erguendo um exército do inferno para eliminar Wallachia, porque a superstição religiosa interpretou erroneamente seus métodos científicos transmitidos para Lisa prestar auxílio aos enfermos.

Existem ruídos na adaptação, nenhuma nunca é perfeita, mas temos aqui algo que trata com respeito o material fonte enquanto oferece um entretenimento de qualidade. É muito mais do que diversas adaptações de games conseguiram alcançar.

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Ação visceral

Em uma das cenas de Castlevania, um personagem, ao ser salvo, afirma que "Usar de violência não era necessário, senhor. Mas eu gostei." É uma frase que encapsula muito bem os momentos mais sanguinolentos da série. Precisava estar ali? Não. Podia ser mais contido? Sim, mas não é e existe uma autoconsciência disso. As cenas de ação são fluídas, estimulantes e violentas. Existem sangue, mutilação e chutes no saco envolvidos no combate. As coisas beiram propositalmente o exagero, mas não deixa de existir o velho fascínio com a violência cartunesca exagerada: é tão exagerado que não pode ser real, e tá tudo bem.

Nessa mesma cena em questão, quando Trevor salva um personagem, ele chicoteia o olho de um de seus agressores para fora. Eu me encolhi no sofá e pensei "rapaz, que besteira." enquanto soltava um risinho de canto de boca. Eu estava entretido. E precisamos falar aqui que, em detrimento dessa representação burlesca de violência, temos cenas mais cruas e pungentes, principalmente para retratar o estrago causado pelos exércitos de Drácula, chegando a dar um nó de leve na garganta.

No fim das contas, Castlevania se equipara com os desenhos adultos que você não deveria assistir, mas assistia mesmo assim. Alguma coisa que lembrou bastante a animação de Spawn feita pela HBO, chegando a imbuir Castlevania de uma certa nostalgia.

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Gostinho de quero mais

Dá pra ficar intrigado com o universo introduzido e desenvolvido nesses quatros episódios, mas quando a coisa começa a atingir um ápice, acaba. Teremos uma segunda temporada no início de 2018, então, resta esperar.

É louvável a ambientação desse mundo desesperador, o senso de humor sombrio da animação e o respeito com o material fonte. Mas o que parece ser apresentado nesses quatro primeiros episódios se assemelha ao esboço de algo promissor, um teste beta. Animações são caras de se produzir e essa de Castlevania é um projeto escrito por Warren Ellis, autor de diversas HQs que parece ser bem passional em relação à adaptação. Isso pode ser um fator indicador da Netflix botando o pé na água para medir a temperatura.

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Nota final

Temos aqui uma aventura minimalista: Trevor Belmont finge que não se importa com ninguém, e ainda assim embarca em uma aventura ao lado de Sypha e Alucard na tentativa de frear os esforços de Drácula. A densidade que o roteiro possui deriva das motivações do antagonista e da subversão dos membros da igreja, mas as coisas param por aí.

O final abrupto e o tempo de desenvolvimenteo que tivemos instiga, mas não leva a uma catarse surpreendente nem nada do tipo. Castlevania não é a melhor transposição de um jogo para as telas, mas tem o potencial para ser. Embora o esqueleto da narrativa seja simples, as ideias que ele abriga são extremamente promissoras. O pontapé inicial da jornada de Trevor, Sypha e Alucard merece 4 morcegos de 5. Vale a pena fincar seus dentes e maratonar mais essa produção da Netflix.