Precisa jogar para entender? Como a história de League of Legends vem sendo expandida em outras mídias

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Precisa jogar para entender? Como a história de League of Legends vem sendo expandida em outras mídias

Por Melissa de Viveiros

Em uma era onde universos compartilhados são mato, parece óbvio apontar que a expansão de uma franquia para diferentes mídias tem efeito extremamente positivo. Mas, além de expandir sua marca para outros formatos, a Riot Games demonstra cada vez mais saber como tirar proveito disso para construir um universo rico e em constante evolução, utilizando a variedade para contar histórias únicas e interessantes.

League of Legends teve início em 2009, quase 15 anos atrás, e não faz parte de um gênero onde a narrativa seja relevante dentro do jogo. Mesmo assim, o MOBA (Multiplayer Online Battle Arena, ou Arena de Batalha Multijogadores Online em tradução livre) sempre teve um pézinho na contação de histórias — seja por meio de interações entre seus personagens apresentadas em falas, passivas secretas, ou pelos antigos Jornais da Justiça, que contavam a história daqueles heróis e do motivo para suas batalhas. 

Mas o game cresceu para além disso, dando origem a um universo cheio de potencial que não precisava se prender a “justificar” o que ocorre no jogo. Com isso, a Riot deu início a uma nova era narrativa, se livrando de conceitos datados e se aprofundando em seus heróis — e anunciando, no aniversário de dez anos do game, sua proposta de ir além com essas histórias, até então relegadas às biografias e contos no site dedicado ao Universo de LoL.

Site do universo continua trazendo novas histórias, mas não é o único espaço para isso. Na imagem, ilustração de uma carta da história de Milio, mais novo campeão do game. (Reprodução: Riot Games)

Para os fãs já apegados a esses personagens, o anúncio foi motivo de comemoração. Parecia que finalmente teríamos a construção da lore de modo coeso, contínuo, e que de fato continuasse se desenvolvendo ao longo dos anos. 

Ainda em 2019, a primeira história em quadrinhos de LoL foi lançada. League of Legends: Ashe – Mãe de Guerra tinha foco bem específico, destacando a personagem titular desde sua juventude e dando espaço para que ela se desenvolvesse. Foi através da HQ que sua relação com Sejuani foi aprofundada, e que o público pôde saber mais sobre Freljord e suas tribos, além de dar aos fãs algo que até então estava em falta: a chance de ver esses personagens de fato estrelarem suas histórias, para além de serem construtos com uma história de fundo.

Há algo fundamentalmente diferente entre saber um resumo da vida dos campeões e realmente vê-los em ação, em narrativas que se movimentam e os desenvolvem. O apelo se torna muito maior pois o universo se torna muito mais vivo, imersivo e completo, de modo necessário para tornar a lore do game algo mais que pano de fundo.

Ashe: Mãe de Guerra foi publicada em parceria com a Marvel. (Reprodução: Riot Games)

Desde então, diversas outras HQs focadas em campeões específicos (e, claro, aqueles relacionados com eles) foram lançadas. Zed, Lux e, mais recentemente, Katarina, estrelaram suas próprias histórias, que contam mais não só sobre eles, como sobre suas respectivas regiões e, no caso das duas últimas, servem também para mover o estado o mundo adiante — Lux contando sobre a rebelião iniciada com a fuga de Sylas e o que levou até ali; Katarina, em paralelo, lidando com a relação de Noxus a esses eventos e atualizando o núcleo da personagem, que não recebia novidades há anos.

Apesar da iniciativa de reiniciar o universo com o reboot ocorrido em 2014, o jogo ainda sofria com a falta de atualizações no quesito lore. O site dedicado ao universo, inicialmente cheio de biografias atualizadas e pequenos contos de cada um, logo passou a ser atualizado cada vez menos. Mesmo com todo seu potencial, a lore continuou a ser deixada de lado — talvez justamente pela dificuldade de integrá-la diretamente ao game, talvez pela Riot não ter encontrado até então o modo certo de levar a história além.

Felizmente, o que começou de forma mais tradicional, com quadrinhos dedicados aos campeões, logo iria muito além. Com a maior conectividade, veio também um universo cada vez mais interconectado da melhor maneira possível. A HQ de Katarina foi divulgada como um prólogo para The Mageseeker: Uma História de League of Legends, jogo mais recente da Riot Forge que continua a trama da HQ de Lux sob a perspectiva de Sylas.

Imagem da edição deluxe de The Mageseeker. (Reprodução: Riot Games)

A distribuidora da Riot publica games criados por outras desenvolvedoras para o universo de LoL, e anteriormente publicou Ruined King, que ao invés de focado em um personagem, contava sobre um grande evento do universo. O jogo mais recente, porém, talvez ainda mais do que a história do rei destruído, tinha uma tarefa difícil.

Ao abordar a rebelião de Sylas, era necessário que a lore do universo se movesse — afinal, tanto para os fãs de longa data quanto para os novatos que jogassem Mageseeker, era necessário uma história com começo, meio e fim. Ainda assim, houve a dúvida de que isso aconteceria de modo significativo, ou se veríamos apenas um conteúdo extra que, no fim, não teria tanto impacto assim (tal como vem sendo o caso com as séries do Universo Cinematográfico da Marvel, por exemplo: há um contexto maior ao assisti-las, mas é perfeitamente possível acompanhar todo o resto sem ter contato com elas).

Ainda assim, o jogo provou como a Riot Forge está no caminho certo. Após anos reduzido à sua rebelião e vingança, Sylas finalmente obteve desenvolvimento como personagem. Junto com ele, a situação de toda uma região desse universo mudou, conforme sua rebelião afetou a nação de Demacia. Mageseeker demonstrou que as histórias exploradas em outros games não são apenas para “preencher espaço”. Elas tem peso, e levam o universo adiante exatamente como deveria ser.

Cinemáticas de início de temporada eram necessárias para movimentar a história até pouco tempo. Na imagem, Sejuani em “O Chamado”. (Reprodução: Riot Games)

A proposta de novos jogos com maior destaque para narrativa dá aos jogadores ainda mais formas de estar em contato com a lore de League of Legends. Além disso, a variedade de títulos menores focados em diferentes partes do universo permite que exista um pouquinho para todo mundo, mantendo a narrativa de Runeterra em movimento sem a necessidade de aguardar dez anos por uma atualização de história, já que há conteúdo novo com maior peridiocidade e muito mais profundidade do que contos curtos e breves momentos na cinemática anual de temporada permitiam que fosse possível.

A variedade de estilos é outro ponto extremamente positivo para a iniciativa da Riot Forge. Enquanto Ruined King foi um RPG de turno, Mageseeker é um jogo mais focado em ação; títulos anunciados, como Conv/rgence, estrelado por Ekko, promete ser um jogo de plataforma, enquanto Song of Nunu foi divulgado como tendo foco em exploração e quebra-cabeças. Mesmo em seu início, a distribuidora demonstra o enorme potencial que esses campeões e seu mundo apresentam, proporcionando experiências diversas e que vão muito além do MOBA.

Claro que nem tudo será um grande acerto. Da minha parte, penso que Ruined King, por exemplo, é um jogo bem superior a Mageseeker. Ambos, porém, tem seu mérito — e, quando falamos de mídias como videogames, onde cada vez mais o foco está nos títulos AAA, com enormes investimentos, a iniciativa de fazer coisas menores com uma franquia tão grande pode permitir oportunidades muito interessantes. 

Jogos menores e mais contidos apresentam algumas das possibilidades mais interessantes para o universo de LoL. Na imagem, Song of Nunu: Uma História de League of Legends. (Reprodução: Riot Games)

A maior prova do acerto da Riot em expandir seu universo para além do MOBA, porém, está em uma mídia diferente. Foi no formato de série animada que tivemos o ápice dessas histórias até agora, vindo com o lançamento de Arcane na Netflix. 

Desde seu estilo artístico único (que demanda tempo e investimento, uma vez que exige que muito seja feito à mão), à sua narrativa emocional acompanhando personagens de Piltover e Zaun, Arcane é uma obra-prima entre as adaptações de jogos. Não há um aspecto sequer da obra que não seja primoroso. 

Seu sucesso, indo muito além dos fãs de League of Legends, não é só uma demonstração dos méritos do jogo. A animação se tornou ainda maior que LoL, conquistando muita gente que não tem o menor interesse em jogar, mas que agora aguarda ansiosamente por mais histórias desse mundo. É a prova final do potencial da lore do jogo, capaz de garantir seu espaço completamente sozinha, sem depender da marca estabelecida no mundo dos games nem ser meramente uma vitrine para o jogo. 

Com arte e narrativa de tirar o fôlego, Arcane é a maior prova de que o universo de League of Legends já superou o jogo que o originou. (Reprodução: Riot Games/Netflix)

Como fã das antigas, é claro que gosto de ver novas falas e interações adicionadas em Summoner’s Rift ou Legends of Runeterra. Como jogadora, fico extremamente empolgada para cada novo capítulo no mundo dos games, e aguardo ansiosa por Conv/rgence e Song of Nunu, bem como pelos futuros anúncios da Riot Forge e outros jogos derivados da própria Riot, como o ainda sem título MMORPG. 

Mas como alguém apaixonada por essa história há mais de uma década, que ama esses personagens e sempre viu potencial neles, é impossível não aplaudir o que o universo se tornou por conta própria. O potencial da lore é gigantesco — e que bom que ela finalmente pode caminhar com as próprias pernas.

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