Assassin’s Creed: Valhalla – Como era a religião dos Vikings?

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Assassin’s Creed: Valhalla – Como era a religião dos Vikings?

Por Chris Rantin

Os Deuses nórdicos estão cada vez mais populares. A cada dia que passa a cultura pop mergulha cada vez mais fundo nesta mitologia, trazendo divindades como Thor, Odin e Loki como protagonistas de filmes, séries de TV, HQs e jogos. Em Assassin’s Creed: Valhalla isso não é diferente. 

Ao longo do jogo veremos Eivor fazendo oferendas, buscando ganhar favores dos seus Deuses, ou encontrando algumas das divindades pelo caminho. Conforme a história avança, é possível visitar Asgard, utilizar as armas dos Deuses e até mesmo conversar com essas entidades, que aparecem como visões para guiar o protagonista desta história.

Mas de acordo com o professor de história medieval na Universidade Estadual de Londrina (UEL), Lukas Gabriel Grzybowski, que pesquisa sobre a representação da Idade Média nos jogos e é doutor em história medieval e moderna pela Universidade de Hamburgo, na Alemanha, é muito difícil definir a relação do povo escandinavo com seus Deuses.

Primeiramente, pois é preciso definir com clareza sobre que momento estamos falando, as religiões não são estáticas e mudam com o tempo, assim como a cultura”, explica. Dessa forma, as práticas religiosas do século VIII, da Idade do Ferro, são bem diferentes das que vemos no final da “Era Viking” no século XI. Segundo Grzybowski, as narrativas atuais que tentam explorar com fidelidade as crenças e rituais escandinavos são poucas e, na maioria das vezes, “compostas por detratores dessas práticas, notadamente aqueles envolvidos na conversão dessas populações ao cristianismo”.

A visão de Odin no jogo

O professor afirma que as informações que temos deste período, os vestígios arqueológicos, são informações fragmentadas e que, muitas vezes, acabam contradizendo os textos existentes. “Isso acaba criando impasses interpretativos e importantes debates entre os especialistas,” conclui.

Se nas religiões monoteístas de raiz judaico-cristã (como o caso do Cristianismo, por exemplo), a relação com as divindades é baseada em uma fé incondicional em uma entidade, isso não pode ser aplicado em diversas outras expressões religiosas, inclusive na religiosidade escandinava.

“De forma simplificada, para um escandinavo da Idade do Ferro ou da Alta Idade Média relacionar-se com uma divindade não está ligado a uma crença incondicional, mas sim a uma relação condicional de trocas,” explica. “Isso se manifesta no ritual. O praticante do ritual e a divindade têm entre si um contrato. E é a troca de favores entre as partes que mantém esse contrato válido.”

Ele continua: “O praticante oferece algo à divindade e em troca espera que essa divindade o favoreça de alguma maneira. Se essa divindade não atender, há uma quebra de confiança que pode levar a uma recíproca quebra nos rituais. A reciprocidade entre o praticante do ritual e a divindade é um elemento central nesse tipo de religiosidade. E esse tipo de relação ativa entre as partes prescinde de uma relação de fé.”

Ou seja, ao invés de uma fé incondicional nos Deuses, a religião escandinava que o “povo Viking” praticava era baseada em acordos e trocas. Quase como uma relação comercial, onde o fiel faria oferendas e esperaria por apoio das divindades – que poderia ou não interceder a favor dele.

E relacionado a isso, ainda que seja algo distinto da religião, é a mitologia escandinava. “É comum a confusão entre a mitologia e a religião, mais uma vez, por causa da influência da matriz judaico-cristã em nossa sociedade, uma vez que os fundamentos da prática religiosa estão indicados na narrativa mitológica desse tipo de religião”, argumenta.

Enquanto no Cristianismo os mitos são recriados, de forma ritual, para a expressão da fé católica, isso não necessariamente acontecia na religiosidade escandinava. Ainda que isso pudesse acontecer, como quando penduravam sacrifícios em árvores para recriar Odin se pendurando em Yggdrasil em busca de sabedoria, “nem todo ritual tinha um caráter mitológico.” Além disso, seria praticamente impossível recriar de forma ritual os mitos de todas as divindades que compõem uma religião politeísta.

Estátua de Odin

Para o professor, os registros mitológicos nórdicos que temos, infelizmente não representam mais do que uma pequena parcela do conjunto mitológico deles. Algo que podemos especular por causa dos vestígios arqueológicos que foram encontrados na região.

“Quando se fala da religiosidade escandinava da ‘Era Viking’, em grande parte as pessoas remetem aos escritos mitológicos compilados e compostos na Islândia no século XII e XIII,” conta. “Todavia, é preciso lembrar que autores e compiladores eram cristãos, e que a Islândia não era mais que uma periferia isolada, onde a religiosidade assumiu suas cores e desenvolvimentos próprios e distintos do restante da Escandinávia, onde uma coleção de narrativas mitológicas não sobreviveu.”

Nos mitos, os dois principais Clãs divinos se dividem entre Aesir – os Deuses que são mais utilizados pela cultura pop, e que normalmente estão mais associados à guerra e a cultura Viking – e os Vanir – divindades mais pacíficas ligadas a natureza, comércio e magia. 

Com morada em Asgard (que literalmente pode ser traduzida como Terra dos Aesir), os Deuses Aesir são os grandes protagonistas dos principais mitos nórdicos. É este o clã de Odin, Thor, Hel, Frigga, Tyr, Heimdall, Sif e tantos outros. São eles que enfrentarão o Ragnarok e que, em sua grande maioria, terão um fim terrível tentando impedir o fim do mundo. Nas histórias mais famosas, os Aesir estão sempre enfrentando gigantes ou sofrendo com as armações e trapaças de Loki. Como o professor ressalta, ainda que Loki apareça junto dos Aesir, os debates sobre sua origem são bem intensos e, até hoje, não fica claro o que ele realmente era, sendo o Deus mais misterioso deste panteão. 

Já os Vanir repousam em Vanaheim, sendo Deuses mais próximo da natureza e da tranquilidade, seus mitos costumam focar em temas como autoconhecimento, magia, ciclos e colheitas. É este o clã de Freyja, Frey, Rowana, Gejfion, Njord, Ran, Gultweig e muitos outros. Suas principais histórias, compartilhadas de forma oral, falam sobre a criação do mundo por Freyja ou exaltam os feitos dos Deuses em sua própria jornada. 

As histórias falam sobre os conflitos entre os dois clãs, incluindo o que seria a primeira guerra do mundo – e que terminou sem nenhum dos lados sair como vencedor, visto que apesar dos Aesir serem guerreiros formidáveis, os Vanir conheciam magia e conseguiam equilibrar a disputa. Com isso acabando quando um acordo de paz foi formado pelas divindades.

Para quem gostaria de se aprofundar nos mitos e cultura, o professor nos deixou a indicação de alguns livros.
Sobre mitologia e religião, ele recomenda “O livro da mitologia nórdica” de John Lindow e “Mitos do norte pagão” de Cristopher Abram; Sobre um panorama geral sobre o Vikings, temos os livros “The Viking World” de Neil Price e Stefan Brink e “The Vikings” de Else Roesdahl; Sobre as descobertas e perspectivas mais recentes sobre o mundo escandinavo, ele recomenda “The norsemen in the viking age” de Eric Christiansen; Já sobre o assunto mulheres no mundo Viking, ele deixa “Women in the viking age” de Judith Jesch como recomendação.

E ai, pronto para se aventurar nesta jornada épica entre visões dos Deuses e buscar formas de honrar o Caolho nas guerras? Mergulhe nesta história! Assassin’s Creed: Valhalla já chegou ao Ps4, Xbox One e Xbox Series X/S.
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