Vingadores: Ultimato nos cinemas brasileiros – Monopólio ou falta de planejamento?

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Vingadores: Ultimato nos cinemas brasileiros – Monopólio ou falta de planejamento?

Por Guilherme Souza

No último dia 26, chegou aos cinemas brasileiros o aguardado Vingadores: Ultimato e, a menos que você more em uma caverna, com certeza já sabe que o lançamento foi um sucesso, fazendo do longa uma das estreias mais aclamadas e concorridas da história. Infelizmente, toda essa expectativa acabou se refletindo negativamente em todos os outros filmes que estavam em cartaz, incluindo filmes brasileiros.

Primeiramente, devo deixar bem claro que o texto a seguir não se trata da qualidade dos filmes ou de gostos pessoais, mas sim, de uma análise comercial em relação ao mercado cinematográfico brasileiro.

Depois do sucesso de Vingadores: Guerra Infinita, era óbvio que o próximo filme dos Vingadores seria um sucesso e ele realmente está sendo, com isso, os exibidores brasileiros têm se aproveitado da demanda do público para colocar o filme em cartaz na maior quantidade de salas que puderem, afinal, o lucro é garantido, contudo, essa prática acabou desfavorecendo todos os outros filmes que estavam em cartaz no mesmo período, tendo de encerrar seus circuitos de exibição prematuramente para dar espaço para o filme da Marvel.

Em tese, nenhuma produção pode ocupar mais do que 30% das salas de um mesmo complexo cinematográfico, medida prevista pela “cota de tela suplementar”, criada em 2015. Não seguir a lei implica na exibição de mais filmes nacionais no ano seguinte, porém a falta de fiscalização permite que os exibidores façam o que bem entendem, ocasionando em produções como Vingadores: Guerra Infinita, Vingadores: Ultimato e Os Incríveis 2 ocupando mais de 80% das salas de cinema em território nacional durante seus períodos de exibição.

Para piorar a situação, o limite imposto pela  lei da “cota de tela suplementar” foi suspenso pelo desembargador Johonsom di Salvo, da 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região em dezembro de 2018, sob o pressuposto de irregularidades nas produções nacionais, suspensão esta que é válida até atualmente, mesmo a contragosto e protestos dos principais distribuidores do país e da ANCINE (Agência Nacional do Audiovisual).

O maior problema em relação a essa predominância dos filmes da Disney se deve ao histórico abusivo da empresa em termos de controle de exibição. Em 2017, diversos cinemas norte-americanos ameaçaram boicotar as exibições de Star Wars: Os Últimos Jedi por conta das exigências feitas pelo estúdio para que pudessem exibir o filme.

Na época, foi divulgado pelo The Wall Street Journal que a Disney exigiu um total de 65% dos lucros das bilheterias do filme, superando os 64% exigidos em Star Wars: O Despertar da Força. Além disso, o estúdio também exigiu que os cinemas mantivessem o filme em exibição nas maiores salas por um período de quatro semanas, sendo que o tempo exigido para outros filmes do estúdio era de duas semanas.

Em janeiro de 2018, outro boicote à uma produção da Disney aconteceu, dessa vez, em solo brasileiro. Na ocasião, mais de 65% dos exibidores brasileiros se recusaram a exibir o filme Viva – A Vida é Uma Festa, pois a Disney exigiu um aumento de 2% nos lucros das bilheterias, revogando um acordo que já durava há décadas.

Com isso, podemos entender que o estúdio está cada vez mais incisivo em relação a seus lançamentos, forçando os exibidores a “dançarem a música que eles tocam.”

Para entender melhor o caso, devemos levar em conta que o Brasil não se resume a São Paulo e Rio de Janeiro, na verdade, dentro desses mesmos dois estados, temos cidades pequenas que, muitas vezes, contam com um único cinema com quantidades limitadas de salas, ou seja, exibir o mesmo filme em todas elas é prejudicial não só para os produtores como também para o público, que perde o direito de escolha do que ele quer assistir.

O ocorrido descrito acima tem afetado grandes títulos do cinema nacional, tais como o terceiro filme da franquia De Pernas pro Ar, cujos filmes anteriores bateram de frente com lançamentos internacionais de peso nas bilheterias e se mostraram muito lucrativos, superando os valores investidos pelo FSA (Fundo Setorial de Audiovisual) em mais de 100% em ambos os casos. Agora, com o baque sofrido por Ultimato, o terceiro filme corre risco de dar prejuízo.

Atualmente, a cultura brasileira de diversas vertentes tem sofrido com os cortes de verba, que pode inviabilizar até mesmo a vinda de grandes produções do ramo teatral para o país, mas além disso, não incentivar o cinema nacional significa não só na perda de lucros como também na limitação de oportunidades de emprego geradas por tais produções, coisa que o cinema internacional não oferece para nosso país.

Outros mercados gigantes como China, França e Índia possuem leis rígidas que limitam a exibição de filmes internacionais, com isso, a indústria se mantém em um nível competitivo saudável, que não se torna abusivo para os produtores nacionais.

No Brasil, existe uma lei onde as escolas devem exibir duas horas de filmes nacionais por mês, porém isso não acontece. Essa falta de contato com produções brasileiras não permite que o público desenvolva uma visão mais ampla em relação ao mercado audiovisual, limitando-se somente aos lançamentos impulsionados pela mídia internacional.

Para encerrar, devemos levar em conta que o Brasil possui cineastas e atores talentosíssimos, porém além de termos uma cultura completamente diferente da dos norte-americanos, as produções nacionais não dispõem de investimentos exorbitantes como acontece nos filmes hollywoodianos, o que implica diretamente em filmes menos ambiciosos.

José Padilha, aclamado diretor dos filmes da franquia Tropa de Elite, foi contratado por Hollywood para dirigir o filme do RoboCop e, durante esse período, declarou que, com dinheiro, os brasileiros também são capazes de comandar produções daquele nível. Realmente seria ótimo ver o cinema nacional produzindo blockbusters que pudessem ser exportados, porém isso é praticamente impossível quando não se tem incentivo, seja por parte do público, dos órgãos públicos e da indústria em si.

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