Legion 2×11 – Por que você não está assistindo essa série mesmo?!

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Legion 2×11 – Por que você não está assistindo essa série mesmo?!

Por Lucas Rafael

Uma das reclamações acerca do finale da primeira temporada de Legion era que, bem, não foi lá aquelas coisas. Não tem como você pensar isso com o finale da segunda.

Antes de prosseguirmos com a análise do episódio, vamos colocar aqui um apelo aos desavisados. Você aí que não viu Legion ainda, ou parou na primeira temporada e clicou nesta matéria por causa do título inquisidor: assista. Sério. Legion é um dos expoentes máximos do argumento que fadiga de super-herói simplesmente não existe, contanto que haja pessoas criativas o suficiente e com ambição o suficiente para elevar as adaptações a outro patamar. Legion é outro nível, você nunca viu nada parecido sob o rótulo “adaptação de quadrinho”, seja em Deadpool, Logan, Cavaleiro das Trevas ou qualquer representante inovador do gênero que você possa recordar, é estranho que o maior campeão em demonstrar o potencial de uma adaptação feita com carinho e criatividade venha de uma série. Do Universo X-Men. Produzida pela Fox. Ainda bem que eles chutaram o balde e resolveram sair da zona de conforto com essas propriedades, sinceramente. The Gifted é ótimo, Deadpool mudou o rumo do cinema heroico, Logan comprovou que não precisam ter medo de inovar, e só Deus sabe o quanto eu estou empolgado pro que vai sair de Novos Mutantes.

Mas sério.

Por que diabos vocês dão as costas pra Legion?

Os números de audiência da FX não mentem, e eu fiquei surpreso da série ter sido renovada para uma terceira temporada. Não viu a primeira? Tem na Netflix e na Amazon Prime. Já viu a primeira? Deixa o PC rodando a série pra dar números pros caras, eles merecem. Mostre Legion para seus amigos, pra namorada, pros seus pais, re-assistam a segunda quando ela chegar nas plataformas de streaming e podem ir atrás dela porque o negócio não é só bom. É único. Esqueçam pousos de super-herói, vilões pastiche, o bem contra o mal, convenções narrativas manjadas, personagens unidimensionais e tramas maniqueístas, Legion está aqui para sabotar sua noção de realidade. Então fica aqui o aviso final: apoiem a cena, caras. Se isso aqui for cancelado, ou se a terceira temporada for menos ousada por questões de alcançar uma audiência maior, não vem reclamar que o gênero heroico anda saturado. Legion é aquele tipo de série que, em um mercado preocupado com a aprovação das massas, onde filmes recebem audições teste para serem editados da maneira mais palatável possível para o público abraçar e gerar o máximo possível de dindin nas bilheterias (nada de surpreendente aqui, negócios são negócios e entretenimento é um negócio lucrativo), é praticamente um milagre que isso aqui exista. E que vai ter uma terceira temporada. Não duvido que o produtor, Noah Hawley, possa estar pagando do próprio bolso, ou vai ver um sheik árabe muito, muito rico curtiu a série e tá bancando. Não sei, só estou grato que existe e espalhando: Vocês não querem deixar isso aqui passar batido. Não existe nada de errado com filmes “padrão” de super-heróis, e até eles volta e meia mostram sinais de inovação e experimentalismo, mas isso aqui é a vanguarda criativa do gênero.

Recado extenso, mas foi dado. Vamos ao episódio. Spoilers daqui pra frente.

Eu não sei nem o que falar sobre o episódio. Legion gosta de jogar bolas curvas na audiência, e começar o season finale da temporada com David flutuando por um deserto cantando Behind Blue Eyes, em um dueto com Amahl Farouk para então o embate de ambos os personagens ser representado através de animações, foi no mínimo, extasiante. Muita coisa acontece, mas vamos ao principal: a série sabota a própria realidade, você não sabe mais por quem torcer, e ao subir dos créditos, o argumento de que David não merece sua empatia é bem convincente. Vemos diversos Davids em sua cabeça, aludindo às suas muitas personalidades, algo que poderá ser trabalhado na terceira temporada. Foi um episódio e tanto, e eu nem me importo de não terem mostrado detalhadamente a luta de Syd e Cary contra o Minotauro.

Sim, a segunda temporada de Legion teve seus baixos: a série eventualmente parecia presa em um canto criativo em que suas surpresas não surpreendiam mais e a trama principal parecia insossa. Ainda acredito que existe gordura no meio destes 11 episódios, mas estes últimos dois funcionam como uma recompensa por sua paciência.

David tenta reprimir a memória de Syd para fazer com que a personagem ainda o ame, mesmo após ser convencida por Melanie de que ele é um vilão. David, mais pra frente, transa com Syd enquanto ela está neste estado mental ilusório, uma cena pesada, embora não gráfica, essencial para criarmos uma antipatia pelo personagem.

O genial aqui é você entender de onde os dois lados da moeda estão vindo: Syd foi mentalmente drogada para ter relações com David, que é um Mutante nível Ômega ultra poderoso com um certo prazer por torturar pessoas, e que vem agindo de maneira suspeita atualmente. Ele é um deus, seus amigos sabem disso, e ultimamente ele está ligado no modo Velho Testamento. Qualquer um ficaria preocupado.

No entanto, David não pediu por isso, passou a vida com um demônio habitando sua cabeça, sendo taxado de louco, até que encontrou um lar e abraçou seus poderes, apenas para ver tudo ruir ao seu redor com sua própria namorada apontado uma arma em sua direção. É um conflito bem instalado, e sobre quem está certo, bem, vai da sua configuração pessoal de realidade.

Retroativamente, a trama faz sentido. Syd ter solicitado a David que encontrasse o corpo de Farouk tem tudo haver.  As coisas se encaixam, os roteiristas não são bobos não, rapaz.

E o mais impressionante é como Legion te leva numa montanha-russa sensorial e estética, embalada por uma trilha-sonora incrível, enquanto atinge acordes emocionais surpreendentes moldados por um tom de filme B. Em um minuto você não acredita que eles incluíram um rato falante na trama. No próximo, você quase vira uma pilha de lágrimas enquanto David afirma que é uma pessoa boa. Que merece amor.

Outro ponto impressionante é como eles conseguiram fazer Farouk parecer simpático e digno de pena. A atuação de Navid Negahban pesa muito nessa hora: o ator deu um show e nós compramos. Seu carisma é muito mais flexível neste corpo do que bem, a bolha amarela demoníaca que víamos na primeira temporada. Ao final do episódio, Farouk vira um anti-herói completo, uma esperança na luta contra David com aquele “que” de diabo ardiloso, o canalha que amamos.

Ao final de tudo, David foge com Lenny, e Clarke, ao ser questionado sobre o que fazer agora, afirma “agora rezamos.” Não me importo se alguns episódios da segunda temporada de Legion possam ter parecidos pedantes, auto-indulgentes ou simplesmente chatos: quando a série de Noah Hawley atinge seus pontos altos (e existiram alguns nessa temporada) tudo que sobra de você é o aplauso.

Espalhem a palavra de Noah Hawley, e que venha um terceiro ano ainda mais insano.